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A ideologia Panafricanista e a Música, por Simão Bengui Eduardo

A ideologia Panafricanista e a Música
Tema: O Panafricanismo: Uma ideologia Africana certa para a mudança de paradigma Político num mundo repleto de Ideologias Anti-África. 
Por: Simão Bengui Eduardo

Parte VIII – A ideologia Panafricanista e a Música; A propagação dos ideias políticos da União Africana pelos fazedores de música.
Se existe um aspecto importante no processo propagador do panafricanismo em diferentes partes de África e na Diáspora é a sua ligação profunda com a música africana, especialmente na alteração da forma de pensar dos fazedores de música nas suas composições. Se por um lado a música é vista como uma combinação de sons que soa de uma forma agradável a orelha de qualquer homem ou mulher, a música releva-se profundamente no seu conteúdo, pela proposição mostrada no que pensa o músico na composição das suas letras. A música esta ligada a cultura de onde os fazedores desta arte o fazem propagando as ideias e a crença dos mesmos em honrar os seus heróis, os seus ancestrais, bem como os seus deuses, situações políticas e vivências amorosas vividas pelos seus fazedores. Na realidade, é possível conhecermos o “espírito de uma dada civilização partindo das mensagens e da forma organizacional da própria música a medida que é propagada ou difundida a sua mensagem levando consigo as emoções do próprio artista enquanto fazedor desta arte. É um facto que “nós acabemos por perceber o que pensa um determinado “músico” partindo da forma como compõe as suas letras, as suas composições e a estrutura contextual que pretende desenvolver nas suas músicas, não só na sua forma harmónica organizacional da música que é perpassada a mensagem pelas notas, mas na ideologia que o músico defende para passar a sua mensagem aos demais na esfera da sua cultura e na sua própria sociedade. Devemos aceitar a tese de que a música é a expressão viva na qual se pode conhecer a profundidade de uma determinada cultura, o que pensa o cantor e as motivações que o levam a escrever e a fazer uma música de dada forma. É utopia pensar que o artista não está ligada uma cultura conforme muitos alegam de que, o artista é livre de compor o que lhe vem na alma esquecendo-se que assim como qualquer homem é produto da sua cultura, o artista pertence a uma dada cultura de onde recebeu a sua educação e uma determinada crença que acaba por defender em diferentes contextos da sua vida ou dentro de uma dada civilização. A verdade é que arte não está fora dos aspectos culturais na qual o “fazedor de música é parte, e em que sociedade pertence, quais são as suas ambições e o que pretende com a sua música.”Uma sociedade sem valores produz músicos e artistas sem valores, uma sociedade que não é conduzida com base no seu conhecimento histórico e espiritual produz artistas vazios sem conhecimento da sua dimensão cultural. O artista é produto de uma dada cultura com os seus problemas (êxitos e fracassos). Constatamos esta evidência partindo no processo das lutas de libertação das sociedades africanas no período colonial e pós-colonial na qual a ideologia “Panafricana” foi determinante na mudança de pensamento dos artistas bem como os fazedores de música que acabaram por contribuir neste processo transformador e revolucionário da mentalidade das populações africanas assim como das lutas políticas que aconteceram a posteriori. Como afirmou o filósofo africano Filomeno Lopes que: “a Arte e a Música permanecem, portanto, ainda hoje, os percursos comunicativos de maior difusão e recepção social global, tal como acontecerá na época da luta de libertação nacional.” As lutas de libertação nacional já advogavam um processo conciliador na “união dos povos africanos” na qual os colonizadores da África já estavam consciente que deveriam devolver as terras aos oprimidos em função do que ouviam nas músicas, canções de lamentações e revolucionárias que eram parte de todo este processo libertador das massas africanas diante de um inimigo comum.
Em função da realidade das sociedades africanas na altura, os “fazedores de música” viveram as mesmas realidades e os mesmos problemas, o que diferia apenas era o local onde a intensidade dos factos sociorraciais decorriam uma vez que a colonização é racismo e era o que se desenvolvia em África na alteração das estruturas sociais africanas e ao mesmo tempo os africanos que se encontravam na Diáspora viviam intensamente o sistema racial na base do racismo institucional e os negros todos entregues a viver nas periferias e nas zonas de pouco desenvolvimento social, os apartheids do mundo lá fora. Nas Américas pela via da arte os negros-africanos conseguiam passar a mensagem deste sistema racial aos outros mostrando os seus mecanismos de actuação na plataforma musical, pela via da poesia, na verdade a arte desempenhava a função de montra na desconstrução do sistema de domínio contra a “raça-negra” diante deste sistema de opressão. Tanto que o “Jazz e o estilo de música Rap pela via da cultura Hip-Hop foi fundamental na consciencialização das massas negras quanto a realidade do sistema de opressão. Em particular este último, Assata Shakur reforçou-nos na ideia que “ o Hip – Hop é uma arma muito poderosa para expandir a consciência política e social dos Jovens.” É um facto que a cultura hip-hop desempenhou um papel importante na massificação do panafricanismo não só por ela ser uma cultura desenvolvida pelas massas negras que colheram dos seus ancestrais a “arte da rima falada ou seja a tradição oral que os rappers desenvolveram em forma de rimas, mas, porque a cultura hip-hop galvanizou os jovens, levou a auto-estima e ao mesmo tempo deu coragem aos negros saberem enfrentar os problemas do dia – a – dia, assim como ajudou os jovens a buscarem do conhecimento histórico da África e relatavam isso nas suas músicas, tanto assim que os Dead Prezz, KRS One, Public Enemy, Rakim, Tu Pac, Laurent Hill e muitos outros conseguiram nos passar a mensagem do sistema de opressão bem como a necessidade dos africanos se unirem para melhor direccionarem as suas vidas. Na Jamaíca Bob Marley e outros fazedores da música Reggae como Piter Toch levantaram alto a bandeira do panafricanismo e as suas músicas eram de uma força inegualável na emancipação dos negros em todas as partes do mundo elevando os ideias de Marcus Garvey e Kwame Nkrumah e outros, na África do Sul Lucky Dube, Miriam Makeba, Hugh Masekela combatiam o racismo montado e mostravam a estrutura do imperialismo na ideia de União dos povos africanos que estavam sendo exterminados em todas as partes…
Numa atimosfera de opressão na qual o apelo das “almas oprimidas” é a sede da liberdade a visão “planetária-ideológica-do panafricanismo” transformava as mentes negras para darem conta da revolução que se aproximava em África, os ideias do panafricanismo que foi muito defendido a nível das políticas dos “estados pós-coloniais para a sua emancipação diante das potências, para afirmação política dos estados a nível da comunidade internacional”, encontrou o seu forte suporte quando muitos artistas africanos locais compreenderam que o sistema colonial só poderia ser vencido com uma população que tenha uma mente panafricanizada. Em Angola em particular sendo uma colónia de portugal, os artistas recorriam nas suas línguas nativas para mostrarem aos demais este sistema vilão que arruinava o espírito das culturas africanas, Teta Lando, David Zé, Os Ngola Ritmos, Bonga e muitos outros artistas revelavam o papel deste sistema na submissão das massas negras. Teta Lando acreditava que só pela via da União os angolanos poderiam vencer, que só pela via da União que é a tese principal da ideologia panafricana Angola encontraria o seu verdadeiro caminho. No Congo RDC muitos artistas espelhavam o orgulho da sua africanidade e promoviam cada vez mais as cultura de paz e de união deixada por Patrice Lumumba assim como os outros panafricanistas. Se por um lado o Panafricanismo dentro da comunidade africana na Diáspora tinha a responsabilidade de dignificar o povo negro e servir como um elo político e cultural à África, com a qual ele desejava estar unido sentimentalmente, e do outro os Africanos vivendo em solo Africano, o Panafricanismo serviu como uma plataforma colectiva de identidade e como uma luta onerosa contra o colonialismo como nos esclareceu o cientista africano Momoh (2003), para Fela Anikulapo Kuti enquanto ativista e músico, acreditava que sem o panafricanismo efectivado a África e os africanos não avançariam e continuariam a viver os mesmos problemas mesmo alcançando as suas independências. Fela Kuti passava nas suas músicas uma mensagem libertador e de identidade africana na firmeza para que os africanos negassem radicalmente o espírito cultural dos seus colonizadores, para negarem a cultura dos invasores da África e passassem a se identificar com as suas próprias culturas. Acreditava Fela Kuti que a solução dos problemas da África passava pela via da organização política e ao mesmo tempo porque os africanos já não se identificavam com as suas culturas e tinham pouco conhecimento da grandeza das suas histórias, dos seus próprios “mitos” que albergava a dimensão espiritual da ancestralidade. O Panafricanismo defendido por Fela era acima de tudo político e cultural na sua pragmaticidade, tanto assim que apelava aos líderes políticos se identificarem com a África e negarem as propostas “armadilhadas” dos racistas que não passavam de artimanha para manter a África nesta condição. Fela Kuti tinha a plena noção de que os negros da Diáspora eram tão africanos quanto ele, afirmava que “todos os países Africanos deveriam abrir suas portas aos Africanos de todo o lugar, especialmente àqueles das Américas…
Actualmente ainda ouvem-se vozes de grandes artistas ligados à ideologia do Panafricanismo e que propagam esta mensagem nas suas letras e composições para a consciencialização dos africanos que já não lutam para implementação desta ideologia na mudança de mentalidade dos Africanos combatendo os sistemas políticos deturpador das sociedades e culturas africanas como é o caso do Rapper Azagaia (Moçambique) que evidencia esta ideologia na sua afirmação, Dobet Gnahore (Gabão), Alpha Blondy, Jah Cure, e um outro angolano que muito promove as culturas africanas de uma forma única e nítida como é o Ndaka Yo Wiñi e muitos outros que vão trasendo a africanidade nas suas músicas."
Texto: ~ Simão Bengui Eduardo (2018)
Muntu

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