Comemorando seus 10 anos de existência, a Nação Maracatu Lua Nova, sediada em Belo Horizonte, lançou agora no começo de 2013 um disco chamado "Os Maracatus do Recife", do grande Maestro Guerra Peixe (1914-1993), que traz 22 canções recolhidas em Pernambuco, transcritas e publicadas em um livro seu com o mesmo nome, nas décadas de 1940 e 1950. André Salles Coelho, coordenador do grupo, em Belo Horizonte, explica que:
“Apesar do livro ser largamente conhecido entre pesquisadores e praticantes de maracatu, essas melodias, em sua maior parte, já estão esquecidas, inclusive entre os integrantes dos grupos mais antigos e tradicionais”, continua André Salles, suspeitando que se trata da primeira gravação do material. “O CD é um registro histórico, mas também é disco com produção musical muito bonita. Maracatus são grupos com muita energia musical. O nosso objetivo é que as pessoas, e inclusive os grupos de maracatus, conheçam essas músicas.”
O Lua Nova nasceu do encanto de André Salles e outros integrantes com o maracatu, o que os levou a fazerem oficinas dedicadas à manifestação e a viagem a Recife para conhecer mestres e praticantes. (...)
No simbolismo, conta André, o maracatu é semelhante aos congados: fazem a festa de coroação de reis negros. Os tambores graves são mais um elemento que aproxima as duas práticas. Se em Pernambuco os grupos são mais próximos do candomblé, em Minas Gerais estão juntos aos católicos.
“O maracatu tem um ritmo marcante, dança, figurinos e canto bonitos, mas o mais importante é promover o encontro de todas as pessoas da comunidade”, defende André, acrescentando que os seus ensaios são abertos a quem quiser ir.André Salles é só elogios ao Bairro Aparecida, onde o grupo tem sede. “É e sempre foi musicalmente riquíssimo”, afirma. O mesmo espaço onde se reúnem congados, guardas e maracatu abriga quadrilhas, grupos de samba, choro, côco e um de música barroca. “Aos poucos Belo Horizonte está começando a conhecer a cultura daqui”, observa, lembrando que no segundo fim de semana de junho acontece ali uma festa tradicional com a presença de 20 guardas de moçambique de várias cidades."
Só pra acabar, esse lindo trecho escrito pelo poeta Manuel Bandeira, que conta como foi seu primeiro contato com o maracatu:
"Uma das mais fortes impressões que guardo do tempo da meninice foi o meu primeiro encontro com um maracatu. Era terça-feira gorda e eu ia para a Rua da Imperatriz, no Recife, assistir de um sobrado a passagem das sociedades carnavalescas. Filomomos, Pás, Vassourinhas. De repente, na esquina da Rua da Aurora, me vi quase no meio de um formidável maracatu. De que “nação” seria? Porto Rico? Cabinda Velha? Leão Coroado? Não me lembro. Dos melhores era, a julgar pelo apuro e dignidade do Rei, da Rainha e seu cortejo — príncipes, damas de honra, embaixadores, baianas. Pasmei assombrado.
Tudo em volta de mim era carnaval: aquilo não! Mas o que é que me fazia o coração pulsar assim em pancadas de medo? Analisando agora, retrospectivamente o meu sentimento, creio que o motivo do alvoroço estava na música, naquela música que mal parecia música — percussão de bombos, tambores, ganzás, gonguês e agogôs, num ritmo obsessor, implacável, pressago... Mesmo de longe (lembro-me de certas noites em que, na velha casa de Monteiro, a viragem trazia uns ecos de batuque, o ritmo dos maracatu...) invocava. Todas essas memórias dos meus oito anos, impagáveis como o cheiro entre mar e rio do cais da rua da Aurora, buliram em mim, mais vivas do que nunca, à leitura do livrinho, É de tororó..."
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