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O tambor e a Ancestralidade


Tamani, tambor falante. Marcado pelas formas de uma ampulheta do tempo

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Conta-se que para o povo Malinké, antes de cortar uma árvore para fazer um Djambé, é necessário pedir licença para o espírito daquela árvore. 
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Se a licença for permitida, aquele Djambé Foulá (tocador de Djembé) será protegido por este mesmo espírito, cada vez que for tocar aquele Djambé.
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Tambor nasce da força da terra e da seiva que mora na árvore. Tambor nasce do espírito de uma árvore. Nasce da força do animal que deu seu couro para ser tocado. Nasce como nasce um #muntu - um ser vivente. Nasce para ser coração encarnado.

Para o povo Bakongo, a árvore está conectada com o Tempo. As raízes são moradas onde descansam os ancestrais. O tronco e os galhos representam nosso próprio Tempo, o Mundo Material. 
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O Tronco conecta a Semente lá no Profundo da Terra (na posição do #Diekenga chamada #Mussoni) ao galho mais alto (na posição #Tukula). Tambor Transmite Mensagens dos Céus Pra Terra. E da Terra Pros Céus. 
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Dos instrumentos mais antigos do mundo, Tambor nos faz lembrar de que Somos Carne, Madeira, Folha. Somos Casa Morada dos Olhos de Tempo. O Tambor nos Conecta com o Tempo e com a Memória do Tempo. E com o Tempo e com a Memória Do Tempo que Habita em Nós. 
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Quando ressoa em determinadas frequências e cadências, ele Ativa Memórias no corpo humano e leva a estados alterados de consciência, em que o ser se funde com o próprio cosmos, sem que haja limites de forma ou de espaço. 
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Se Somos Seiva, Carne, Folha e Madeira, quando Ressoa um Tambor é bem provável que nos faça Lembrar de essências e Memórias Perdidas, Arrasadas, Inundadas em meio à Liquidez das Informações na Contemporaneidade.
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re.Ativação de Memória Sócio.Corporal. Atômica.Intracelular. re.Ativação de Memórias de Constelações Familiares e Comunitárias Ancestrais, Ligadas por Linhas de Tempos Flutuando pela Linha de Kalunga, que também é Nosso Próprio Cordaão Umbilical.
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           dançaMusica    .      corpoTambor
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Se o próprio corpo nosso é CorpoTambor ! mas talvez SEM a consciência consciente de que É CorpoTambor! - MUNTU KALA NGOMA - 
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se BatucarDançar é medicina espiritual.

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se 3 diz respeito a uma união familiar. três tambores juntos ressoam nas celebrações, tanto na própria Áfrika quanto em territórios da diáspora negra.
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Na tentativa de me libertar, meu corpo e alma tiveram (e ainda tem) que passar por momentos em que danço e me relaxo ao som de tambores para acessar elos perdidos de conexão com ramas de minha ancestralidade, que foram renegadas por processos de colonização. 
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Quando eu Ouvi os Tambores foi que os Tambores me Lembraram de minha Essência. Foram as Frequências Sonoras dos Tambores que despertaram os Totens Guardiões da Memória Ancestral de Minhas Linhagens Familiares e dos Lugares do Mundo por Onde Caminhei. 
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Um Mandengue não só Toca Um Tambor. Ele conta histórias que saltam da pele do instrumento e se movimentam com a natureza e com os tempos do passado, do presente e do futuro.
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O pensador Congolês Fu kiau aponta a música percussiva como parte fundamental do nascimento do #Muntu. ele afirma que para os #Bakongo, os instrumentos que se fazem fora do corpo são iguais à percussão do coração.
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O som que emite o TAMBOR é portador de energia vital que estabelece a comunicação com a força dos ancestrais e a própria natureza. Em muitos rituais ancestrais, os tambores eram tocados para os elementos, para as Águas, o Fogo, o Ar, a Terra, a Chuva, o Vulcão, para o Éter.

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Tambor trás Ritual e Jogo de Corpo. Ritual e Jogo de Corpo são portais que liberam acessos a determinadas informações ANCESTRAIS preservadas pelos próprios Rituais, por terem sido CODIFICADAS através de movimentos, gestos, sentidos, claves de ritmos. Assim, quando toco ou escuto o som de um tambor, abre-se um portal de restauração de memórias passadas dos ancestrais dentro deste instante já, no aqui agora da contemporaneidade.
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Sérgio São Bernardo, em mini curso ministrado no V Congresso de Filosofia da Libertação (BA, 2017), nos diz que a Ancestralidade é produção de cultura, de pensamento, de histórias, de ferramentas. Ele nos está dizendo que a Ancestralidade também é algo concebido no momento Presente e não algo apenas condicionado a um lugar imóvel no Passado. 
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Neste INSTANTE-JÁ nós estamos concebendo a nossa própria Ancestralidade - o legado hereditário que deixaremos para os nossos filhos, filhos de nossos filhos e para nossa comunidade.  
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Como é que queremos ser lembrados por nossa família, por nossa comunidade quando atravessarmos a linha de Kalunga, quando partirmos deste plano e voltarmos para as raízes da árvore do Tempo, morada dos ancestrais? 
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. Qual o nosso legado? 
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Não sei se ainda estou pronta para responder esta pergunta. Mas sei que Quero ser tambor. Quero fazer de meu Corpo Tambor. 
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Quero assumir que, cada vez que minhas mãos fazem ressoar um tambor, a natureza se desperta e o legado do que eu mesma venho deixando para as comunidades onde vivo se nutre pela vibração do SOM. 
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Tambor. Instrumento de convocação ritualística para o nascimento, as festas e a guerra.
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Força Propulsora do Impulso que faz o Remo Remar o Barco e Atravessar o Mar.

Guardião de linhagens ancestrais e da memória da comunidade e de um povo.
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Mo Maiê, Barra Grande de Itaparica da Bahia, novembro de 2017.

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