NTANGU, TANDU, KOLO, O conceito Bantu Kongo do Tempo
TRADUÇÃO do original NTANGU TANDU KOLO, The Bantu-Kongo Concept of Time
Autor: FU-KIAU, B. K. K.
Originalmente publicado em: ADJAYE, J. K. (Org.). Time in the Black experience: Contributions in AfroAmerican and African studies. London, 1994.
Traduzido para uso didático por Mo Maiê (2016)
Esse capítulo discute os conceitos do tempo para os povos nativos do Kongo do Centro-Oeste da África.
“Kongo” refere-se a um grupo cultural, linguístico e histórico de pessoas que descendem do grande grupo Bantu que migrou do sul da região do Rio Benue (atualmente Nigéria) para a floresta equatorial do centro-oeste africano e proximidades.
Remontando ao segundo milênio A.C., lentamente aconteceram ondas migratórias de comunidades Bantu em direção ao sul, processo que fez com que a maioria dos africanos que vivem na região ao sul do equador viessem a falar uma ou mais das 400 línguas relacionadas ao Bantu. Poucos séculos depois, na Idade do Ferro, assentamentos de Bantu foram estabelecidos através da região.
O passado, as origens e história em comum, além de mais de meio milênio de relações de trocas, fizeram surgir uma afinidade entre as tradições culturais, sistemas de crenças e conceitos acerca do tempo entre o Kongo e os outros grupos Bantu.
A era moderna da história do Kongo data do século 13, quando novos colonos começaram a fortalecer a base de suas instituições étnico-políticas ao sul da bacia do rio Kongo (Angola, na atualidade) sob a liderança coletiva dos chefes (Mfumu) que eram eleitos pelos anciões mais sábios (Bakulu). A partir dessas pequenas chefias eram estabelecidos sistemas de estados maiores e mais poderosamente centralizados, com instituições políticas bem estabelecidas (Sikudukusulu).
Um dos maiores e mais poderosos desses estados foi o Kongo, que se expandiu de sua base angolana para a área moderna do Zaire e da República do Kongo. Outros reinos Bantu foram criados na região do Rio Congo, incluindo Bemba, Lunda, Lulua e Kuba.
De longe, o estado Bantu mais bem sucedido do centro-oeste africano foi o Kongo, que desenvolveu uma tecnologia altamente avançada para trabalhar o ferro, uma cultura agrária, complexos sistemas de troca e elaborou instituições políticas bem antes da chegada dos primeiros europeus no fim do século XV.
O alto nível de cultura material alcançado pelo estado Kongo por volta do século XVI foi noticiado tanto nas crônicas orais quanto por evidências documentais. Na visão de um cronista, “naquela época, em termos de reservas naturais (a Europa Ocidental) era mais pobre e em termos econômicos, mais atrasada do que avançada.” (Baran 1961, p.138)
No entanto, a glória do estado do Kongo não durou muito depois da chegada dos europeus, que assinalaram o início de seu declínio até seu desaparecimento.
Com a chegada dos europeus quase simultaneamente às Américas e com o estabelecimento dos sistemas de plantação baseados na escravidão, o destino do Kongo e do “Novo Mundo” se entrelaçaram pelos próximos séculos.
O Kongo, junto com outros estados do centro-oeste africano, tornou-se a região da África em que os europeus obtiveram a maioria dos escravizados que cruzaram o Atlântico para trabalhar nas plantações da América durante os três séculos e meio do tráfico negreiro, do século XVI ao século XIX.
Além disso, foram as atividades do tráfico dos portugueses, mais do que qualquer outro fator, que contribuíram para a desestabilização e eventual queda do Kongo – política e economicamente.
Ao mesmo tempo, com o pretexto de civilizar o povo Kongo, as atividades missionárias foram lentamente aumentando a penetração européia na região.
Por fim, no fim do século XIX, o desejo europeu de obter as riquezas naturais da bacia do Kongo (o ouro, o ferro, o marfim e a borracha, por exemplo) para atender as necessidades de sua expansão industrial, o potencial do rio de ser uma rota comercial, a vitimização da região (assim como do resto do continente) e o desempenho do poder político europeu, tudo culminou na colonização da bacia do Kongo.
Assim, o território que uma vez foi o antigo Kongo deu origem a três estados coloniais controlados por portugueses, belgas e franceses, de 1880 até a independência nos anos 60 e 70 do século XX, quando os territórios coloniais se tornaram as nações modernas de Angola, Zaire e República do Kongo, respectivamente.
Ainda que o povo Kongo (Bakongo, singular Mukongo) tenha sido separado em três diferentes nações, eles compartilham de tradições sociais, artísticas, econômicas e espirituais em comum, como descendentes de um mesmo estado histórico e por falarem a mesma língua, o Kikongo.
A cultura, a história e a política do Kongo foram temas de inumeráveis trabalhos de escritores, tanto de dentro, quanto de fora da Áfrika, mas poucos se preocuparam com a questão do Tempo, e aqueles que o fizeram, focaram-se no tempo em que eu descreveria como o cotidiano, o sentido “mundano” da palavra, que é o conceito de tempo geralmente usado para os não-iniciados, os biyin-ga.
Essa é a compreensão do tempo compartilhada na hora das refeições, nos mercados, nos casamentos, na dança.
É também um gênero de Tempo que é incorporado nas conceitualizações de acontecimentos do passado recente e colonial ou no planejamento de futuras atividades (em termos de dias, semanas ou anos).
Nesse sentido, vários trabalhos me vêm à mente. Um deles foi escrito por Jan Vansina, “Caminhos nas Florestas tropicais: rumo a uma história de tradição política na África Equatorial” (1990), no qual o autor discute a consciência do conceito do Tempo (ou a ausência de tal consciência) na literatura ocidental, em se tratando da história da África.
“Para avaliar a posição dos fatos, tanto pré-colonial quanto colonial”, escreve o autor, “é necessário conhecer a data local da conquista colonial e o colapso do tempo desde então". (Vansina 1990, p. 21).
Infelizmente, ainda que este conceito de Tempo tenha alguma utilidade, ele poderia até mesmo ser uma barreira em termos de valorizar certos acontecimentos na linha cronológica da história Africana.
Vamos supor que certo documento da era pré-colonial ou colonial, em 1600, mencionasse a existência da Instituição Lèmba pela primeira vez no registro escrito. Apenas a partir deste fato nós deveríamos concluir que essa instituição possa ter surgido do nada, na data em que o documento foi escrito, mesmo que essa instituição em particular possa ter surgido há centenas de anos atrás?
Tais abordagens das concepções do passado africano possuem óbvias limitações, a menos que haja evidências de outras fontes.
Antes, em seu livro “The Children of Woot: A History of the Kuba Peoples” (1978), Vansina apresentou um resumo de duas páginas de suas investigações sobre os conceitos do tempo do povo Kuba.
Ele mencionou que o povo Kuba do Zaire datava fatos de aldeias abandonadas e referia-se aos dias comerciais da semana, mas concluiu que eles tinham uma concepção limitada do Tempo: “parece um pouco estranho que a contagem dos dias estivesse fora do contexto comercial” (p.20). Em qualquer caso, será aparente nesse capítulo que minhas preocupações com o Tempo partem de uma perspectiva totalmente diferente.
Dois outros estudos sobre o tempo são dignos de nota: “Religiões africanas e filosofia”, de John Mbiti (1990 [1969]) e “A percepção empírica do tempo e a consciência do tempo na história no pensamento Bantu” (1976)
No entanto, ambos são estudos gerais do tempo, mais do que especificamente Bantu, além disso, como as obras de Vansina, adotam uma abordagem diferente da minha.
Em contraste com esses aspectos “mundanos” do Tempo mencionados acima, a preocupação deste capítulo é com os domínios do tempo que surgem do mundo exotérico do Kongo, o mundo dos Bangdnga, os Mestres, os Iniciados.
As Escolas de Iniciação, centros de ensino superior, proibidas aos não-iniciados, eram os veículos através dos quais esses conhecimentos eram disseminados.
Assim, os conhecimentos de seus ensinamentos eram inacessíveis aos europeus e a todos os estrangeiros. Por causa de sua natureza, essas instituições de ensino superior foram abolidas pelos poderes coloniais e os seus ensinamentos caíram por terra.
Felizmente, eu fui privilegiado por ter sido iniciado em uma destas instituições, e seguindo o passo dos mestres, eu aprendi, num período de dez anos, o que esse ensaio expressa sobre o conceito Kongo do Tempo.
As outras referências são baseadas em meu trabalho e experiências pessoais com a cultura Kongo, da qual faço parte tanto através de meu sangue quanto através de meu interesse acadêmico.
O conceito Kongo do tempo aqui descrito é profundamente enraizado em nossa visão de mundo, nossa cosmologia, que é a base curricular de todas as instituições de ensino superior.
Sua centralidade em nosso sistema de conhecimento vem do fato de que o tempo está no coração de nosso entendimento não apenas do universo e seus processos (dingo dingo) de criação, transformação e funcionamento, mas também da vida propriamente dita. É através do tempo que, tanto a natureza quanto a pessoa humana, tornam-se compreensíveis para nós. O tempo valida e provê verdades para nossa existência.
Esse capítulo discute o tempo cósmico, natural, vital e social entre os Bakongo. Ele também vai examinar o conceito Kongo referente ao passado, presente e futuro. Será demonstrado que, primeiro, o tempo é cíclico e todas as criações, instituições e sistemas passam por um processo cíclico de quatro estágios. Segundo, que este processo de quatro estágios pelo qual passa o tempo tem relevância social para os Bakongo.
O conceito Bantu-Kongo do Tempo
O tempo para o povo Kongo é uma “coisa” cíclica. Não tem um começo nem um fim. Graças aos “Dunga” (acontecimentos), o conceito de tempo é entendido e pode ser compreendido. Esses “dunga”, sejam naturais ou artificiais, biológicos ou ideológicos, materiais ou imateriais, constituem o que é conhecido como “n`ka-ma mia ntangu” que, em Kikongo, significa “represas do tempo”.
São essas represas do tempo que tornam possíveis tanto o conceito quanto a divisão do tempo entre os Bantu-Kongo. Assim, o tempo é, ao mesmo tempo, concreto e abstrato. No nível abstrato, o tempo não tem começo nem fim. Ele existe por si só e flui através dele mesmo, com seus próprios acordos. No entanto, em nível concreto, são os “dunga” (acontecimentos) que fazem com que o tempo seja perceptível, provendo o fluir interminável do tempo, com específicas “represas”, acontecimentos ou períodos de tempo.
É virtualmente impossível captar o conceito Bantu.Kongo do tempo aqui discutido sem antes conhecer certas palavras-chave que expressam e encarnam terminologias do tempo na cultura Kongo, a base desse trabalho. Cada uma dessas palavras precisa ser claramente compreendida para que o conceito que elas descrevem possam ser entendidos.
Existem três palavras-chaves na linguagem Kikongo que traduzem o termo “Tempo”.
A primeira e a mais usada delas é “ntangu”.
O termo “ntangu” encontra suas raízes na palavra “tanga” – contar, ordenar, acumular, entrar, voltar e sair. O mesmo verbo ainda pode ser traduzido por “dançar” e “ler”, e também caminhar com seus próprios “ntanga” (pés, pernas). É dessa raíz que se deriva o termo “matanga” (singular “tanga”), uma cerimônia exuberante de dança, acompanhada por vários instrumentos musicais. Essa cerimônia acontece em conexão com os ritos finais do funeral de um líder comunitário. É interessante notar que os nomes das danças latino-americanas Tango e a dança cubana Matanza derivam-se diretamente do festival de dança Kongo da Matanga. “Tango”, de fato, deriva de sua forma singular, enquanto Matanza é a forma plural de “Matanga”.
A segunda palavra-chave usada pelos povos Kongo que se traduz por tempo é “tandu”, que vem da raíz do verbo “tanda”, marcar ou alinhar, lançar.
A terceira palavra-chave usada para traduzir o tempo é “Kolo”. Esse último termo é ligado ao verbo “Kola”, que expressa um estado do ser, um nível de força por um dado período de tempo. O conceito de “horas” é expresso pelas palavras “lo”, “lokula” e “ndo”. Os seguintes exemplos ajudarão a ilustrar os vários contextos em que tais terminologias referentes ao tempo são usadas em Kikongo:
Nkia ntangu kizidil - Que horas ela (ele) chegará?
Ntangu ka yazayakana ko - O tempo não era conhecido.
Ntangu yampasi - Tempos difíceis.
Tekila tandu kieto - Antes do nosso tempo.
Mu tandu kina - Naquele tempo (Período).
Mu kolo kiaki - Nesse tempo (Era).
Kukondolo nkama miantangu, kwena kolo ka ko - Onde não há represas de Tempo, não há Tempo.
Ainda que seja evidente que algumas das terminologias são imutáveis, cada uma delas tem um significado específico, expressivo e semântico para a pessoa que fala Kikongo, porque tais significados foram estabelecidos a partir da cultura Bantu. Isso precisa ser entendido a fim de que o conceito de tempo entre as pessoas dessa área cultural Bantu específica seja compreendido. Isso deve ser entendido se uma pessoa quer ter uma compreensão própria sobre as formas através das quais o povo Bakongo conceitualiza o tempo e também para aqueles que compreendem os sistemas culturais, religiosos e filosóficos da África de uma maneira tão precária na literatura ocidental, devido à falta de um entendimento de conceitos-chave de linguística.
O povo Bakongo reconhece quatro esferas do tempo: o tempo cósmico, natural, vital e social.
O Tempo Cósmico (Tandu Kiayalangana)
Em sua cosmovisão, os Bantu-Kongo chamam de “Tandu Kiayalangana” ou “Tandu Kia Luyalungunu” o “tempo cósmico”, o ilimitado e contínuo processo de formação dos Dunga (acontecimentos) através do universo (Luyalungunu), pelo poder e energia da Kalunga, a força suprema (Fu-Kiau, 1969; 1991).
Em outras palavras, o tempo cósmico representa a cronologia atual, contínua e ativa da energia da Kalunga e suas represas (n´kama) ou novas criações no universo inteiro através da instrumentalização do poder da Kalunga, o agente da mudança e da criação:
Depois do aparecimento do Muntu (ser humano) no planeta Terra, a energia da Kalunga ativou o seu plano maior para que a Terra continuasse em outro lugar, do outro lado do M´nagu a zulu (teto do céu) para incendiar (Lunga tiya) no vazio do Mbungi a luyalungunu (a cavidade do universo) e invadi-lo para a formação de novos mundos.3
Para tornar-se plenamente vivos, esses novos mundos também serão tema para os quatro estágios cardinais do Cosmograma Kongo, como será mostrado adiante.
Cada corpo (mundo, planeta) no universo tem seu próprio tempo cósmico, seu próprio processo de formação. Entretanto, as antigas escolas de iniciação Bantu-Kongo pensavam que todos os processos cósmicos do tempo englobam quatro grandes passos, para os quais tudo na vida é subjetivo, inclusive os sistemas. A Cosmologia Bantu ensina que para completar seus processos de formação ou dingo-dingo, um planeta precisa atravessar esses quatro estágios ou “represas do tempo” (n´kama mia ntangu) chamadas de Tempo Musoni, Tempo Kala, Tempo Tukula e Tempo Luvemba.
Tempo Musoni (Tandu Kia Musoni)
O Tempo Musoni é o começo de todos os tempos. A mitologia tradicional Kongo refere-se a tal período como Tandu Kia Kuku Lwalamba Kalunga (literalmente, “o período do cozimento da Kalunga”), a era fervente da matéria magmática (Fu-Kiau 1969, pp. 17-27).
Esse é o período durante o qual o vazio (luyalungunu) encheu-se de matéria em fusão. Esse foi o início do kele-kele dia dingo-dingo dia ntangu ye moyo, “a faísca dos contínuos processos do tempo e da vida” em todo o universo; a colisão das colisões (o Big Bang).
Esse estágio do tempo chamado Musoni tornou-se o símbolo de todos os começos e o primeiro passo em todos os ensinamentos Kongo de Ensino Superior. Ele ocupa a primeira posição no Cosmograma Kongo (dikenga dia Kongo). Durante esse período, depois de completar processos de resfriamento, a Terra, nosso planeta, tornou-se uma realidade física. Amarelo é a cor simbólica da era Musoni, a primeira grande “represa” do Tempo (n´kama wangudi wa ntangu).
O reconhecimento é dado à importância do tempo Musoni não apenas como a pedra angular do Cosmograma Kongo, mas também como a semente, o ponto inicial de todo desenvolvimento na sociedade do Kongo. O Mukongo diria, por exemplo, que quando uma semente é lançada na terra, a ação está sendo enraizada na posição Musoni. Similarmente, quando uma ideia está sendo formada ou desenvolvida na mente de alguém ou quando um casal Mukongo planeja uma família, eles começam no estágio Musoni. Essa é a hora do n´dingu-a-nsi (a profundeza da noite, a meia noite). É a posição na qual as forças vivas universais (masculinas e femininas) unidas dentro do útero tornam-se ma (matéria).
Tempo Kala (Tandu Kia Kala)
Kala é o segundo estágio da formação dos planetas e de suas transformações. Depois que se completou o ciclo do resfriamento da Terra veio o estágio do tempo Kala (Tandu Kia Kala). Durante essa era a Terra presenciou grandes transformações. A vida em sua forma mais primitiva – seres microscópicos (zie), algas – começou a existir (Kala) nesse período. O solo era úmido e a água podia ser encontrada em todas as partes. O negro é a cor simbólica dessa era, a segunda grande “represa” do Tempo (n´kama wanzole wangudi wa ntangu). Nesse estágio Kala, o mundo viu o sol saindo das profundezas do universo, o mundo espiritual ou o mundo dos ancestrais (o mundo inferior) para o mundo físico (o mundo superior), trazendo não apenas luz mas também esperança, alegria e energia criativa.
Novamente, a conceitualização do tempo cósmico de Kala tem direta relevância social. A posição Kala é vista como a posição em que todos os seres biológicos tornam-se seres vivos (mu kala). É a posição de todos os nascimentos. Por essa razão é que o nascimento da criança (mwana) na sociedade Bantu-Kongo é concebida da mesma maneira em que uma pessoa vê o sol saindo no mundo superior: “o nascimento de uma criança é percebido como o nascer do sol no mundo superior (ku nseke), o mundo físico ou o mundo da comunidade viva.”(Fu-Kiau 1991, p. 8)
Tempo Tukula (Tandu Kia Tukula)
O tempo Tukula é o terceiro estágio da formação dos processos dos planetas (mundos) e de suas transformações que seguem a era Kala. Nesse período do tempo Cósmico, nosso planeta amadureceu (Kula). A vida que existia durante a antiga era Kala amadureceu e prosperou. Os animais também surgem em um ponto da era Tukula. Esse estágio ocupa a terceira posição no Cosmograma Kongo, Dikenga. A cor simbólica dessa era, a terceira grande “reserva” do tempo, é o vermelho, que simboliza o crescimento/maturidade (Tukula literalmente significa “deixe-nos crescer/amadurecer”).
Tukula incorpora a zona “V” (figura 2.2), a zona mais crítica do processo biológico de todos os seres vivos, especialmente os seres humanos. Representa o ponto do mais alto nível de criatividade. Nações em que os líderes não têm consciência do papel que o “V” tem no poder criativo humano estão fadadas a fracassar política, econômica e socialmente. Dessa maneira, lugares, povos, nações, organizações, sistemas e instituições deveriam aprender a engrandecer-se e encarar os desafios que os confrontam. Uma razão pela qual várias pessoas, especialmente em seu apogeu, estão decadentes hoje em dia é devido à falta de habilidade para reconhecer e utilizar a força criativa da Zona “V”.
Tempo Luvemba (Tandu Kia Luvemba)
Esse é o quarto estágio e último período ou era pela qual um planeta passa para completar seu processo de formação e transformação. Ele segue o tempo Tukula.
De acordo com a escola de ensino superior Bantu-Kongo, durante essa era, Maghûngu4 existiu no planeta. Maghûngu era um ser andrógeno, completo por si só. Esse ser mitológico era “dois em um”, macho e fêmea. Através de contínuas buscas por rituais, Maghûngu foi cortado em dois seres separados: Lumbu (macho) e Muzita (fêmea). Nesse momento, o planeta Terra tornou-se vivo por inteiro, por completo, por si só. Lumbu e Muzita, para manter a unidade de quando eram Maghûngu, decidiram permanecer juntos durante a vida (casados). Tornaram-se mulher e marido (n´kento ye bakala) (Fu-Kiau 1969, pp.17-27).
Com esse novo começo de vida, o ciclo cósmico do Tempo completou-se (Figura 2.1) e um novo estágio de tempo iniciou-se – o tempo vital.
No entanto, antes de entrar na discussão sobre o tempo vital, é preciso elucidar algo a respeito da maneira como os ensinamentos cosmológicos Bakongos explicam a infertilidade de alguns corpos celestiais.
Como foi explicado acima, o planeta Terra tornou-se inteiramente vivo somente porque oportunamente completou seu ciclo através dos quatro estágios cosmológicos esboçados na Figura 2.1. Deste modo, a explicação dada aos corpos celestiais que são inférteis nos dias atuais, como a Lua e Marte, desdobra-se em duas: eles não completaram os quatro maiores estágios do ciclo cosmológico que concluiriam seus processos de formação e transformação e por isso permaneceram no estágio congelado, ou foram alvo de alguma colisão catastrófica de um “big bang” sideral que destruiu completamente ou abortou seus processos de criação e transformação enquanto a Kalunga, a energia criativa, segue no espaço sideral o seu trabalho de preparar as chamas universais, expandindo-as e criando novos mundos (planetas).
Tempo Vital (Ntangu a zingu/moyo)
Como o tempo cósmico, o tempo vital (ntangu a moyo) é cíclico. Ele começa num ponto e termina no mesmo ponto, para fechar o ciclo, e depois, submetendo-se a transformações, um novo ciclo se inicia. A longevidade ou período deste tempo vai depender da natureza particular e do poder vital do “ser”, conceito ou sistema envolvido (Fu-Kiau 1991, p.45). Todas as coisas viventes, conceitos e sistemas passam por esse ciclo temporal. Assim, o tempo vital pode ser visto como um tempo biológico quando é relacionado à vida e sua energia criativa (reprodução). Seu ponto inicial, Musoni, é chamado Kenko Dia ngyakulu, o ponto da concepção.
De acordo com os ensinamentos Kongo, nada existe que não siga os passos cíclicos do cosmograma Kongo. Pessoas, animais, invenções, sistemas sociais e assim por diante, são concebidos (yakwa/yindulwa) e vivem através de um tipo de gravidez (Estágio 1), nascem (butwa) (Estágio 2), amadurecem (kula) (Estágio 3) e morrem (fwa) no estágio de colisão a fim de se transformar (Estágio 4).
O período do tempo vital depende da quantidade de energia gerada pelo “tema” envolvido. É o tempo vital (ntangu anzingila) e sua energia viva que determinam a longevidade do ser humano, dos animais, insetos, cobras, peixes, plantas, fungos e assim por diante. Quando a energia viva desse tempo diminui, os seres vivos tornam-se debilitados, a velocidade de sua morte aumenta e seu ciclo vital se reduz. Enfim, eles morrem a fim de transformar-se e começar um novo ciclo.
O conceito Bantu-Kongo da morte é muito manifesto.
Morrer não é o fim: “tufwanga mu soba” – nós morremos a fim de nos transformarmos (Fu-Kiau 1969). Morrer não é apenas um processo, mas uma “represa do tempo”.
Como uma “represa do tempo”, tem seus próprios pontos de referência na estrada cronológica, e como um processo, permite que a vida siga seu fluxo e regenere (dikitisa) seu poder/energia (ngolo) a fim de criar um novo estágio do ser ou sofrer transformações capazes de reintegrar o corpo ao “corpo-energia” universal.
A energia viva que existia antes de tornar-se matéria no momento da concepção é novamente libertada.
Tempo Natural (Ntangu Yasemuka)
O tempo natural, Ntangu Yasemuka, também chamado de ntangu yamena, é o tempo que controla as coisas da terra, seus movimentos, crescimentos, florescimentos, fecundação e aninhamento. É o tempo que determina as mudanças sazonais e traz o rejuvenescimento ou o envelhecimento à vida. Através de seus movimentos, o tempo natural traz quatro estações naturais à vida:
1. Nsungi a mvula, a estação das chuvas, é fundamentalmente uma estação de limpeza, vitalidade e crescimento. É a estação na qual o céu olha para baixo enquanto a terra levanta seus braços. Nas partes mais frias do mundo corresponde ao inverno.
2.Nsungi a sivu, a estação do frio, é um tempo em que a natureza reduz sua respiração pesada, um processo que reduz não apenas sua temperatura, mas também sua altura, aumentando seu poder para alimentar o reino vegetal.
3.Nsungi a lakumuka é um período que corresponde à estação do outono no ocidente, um tempo em que as árvores perdem suas folhas, por isso chama-se lakumuka (outono). Em algumas partes do mundo quase não se fala sobre essa estação porque apenas algumas árvores sofrem o processo de queda das folhas (dingo-dingo dia lakumuna/kula). É o tempo da natureza renovar os nutrientes do solo e se preparar para um novo ciclo.
4.Nsungi a mbangala é a estação que corresponde ao verão (nsungi a mbangala), um período de grandes movimentos e atividades em todas as partes. É o tempo em que o reino vegetal redescobre seu manto verde, em outras palavras, é o tempo em que a proteção verde da natureza ou o mato ou torna-se seco, ou seja, morre para ceder espaço para nova vida.
Assim como os outros tempos, o tempo natural é também tema para os princípios vitais dentro do Cosmograma Kongo. Cada uma dessas estações corresponde a um estágio específico do cosmograma.
Tempo Social (Ntangu amvukanana)
O tempo social é o tempo responsável por todas as atividades dos seres vivos. A aplicação do tempo social aqui, entretanto, será limitada aos seres humanos e ao povo Bantu, em particular, aos Bakongo. É o tempo em que o Muntu (humano) é envolvido em uma atividade particular, tanto puramente social (conversar, casar-se com uma irmã da comunidade, dançar), econômica (trabalhar, negociar), política (instaurar um novo líder político, solucionar um conflito), educacional (iniciar novos líderes), filosófica (recitar provérbios, falar) ou histórica (ouvir um masamuna, o griô).
Implicações sociais dos conceitos temporais
Assim como em todas as outras áreas do tempo, o tempo social, em todas as suas divisões, em si é tema para o Dikenga, o altar cosmogônico, e para seus principais passos na vida chamados de Musoni (passo 1), Kala (passo 2), Tukula (passo 3) e o Luvemba (passo 4).
Assim, a semana Kongo tradicionalmente possui apenas quatro dias, correspondendo aos quatro mercados Kongo - Bukonso/Konzo, Mpika, Nkoyi e Nkenge/Nsona.
Similarmente, os dias são divididos em quatro principais períodos de tempo (lo bianene/biangudi) – n´dingu-a-nsi (meia noite), nseluka (nascer do sol, ou seja, por volta das 6 da manhã), mbata (tarde) e ndimina (pôr do sol) – e quatro entre-horas (lo biandwèlo) – makièlo (o abrir-se da manhã, ou seja, 3-4 horas da manhã), kinsâmina (entre o nascer-do-sol e a tarde), nsinsa (entre a tarde e o pôr do sol) e o malo-ma-tulu (entre o pôr do sol e a meia noite).5 Cada hora ou período de tempo por si só é um dos temas principais do cosmograma Kongo, como mostra a Figura 2.3.
Além disso, em resposta ao princípio cosmológico dominante, uma típica aldeia Kongo tinha quatro entradas (mafula), sendo que as casas de seus principais cidadãos ou grupos estavam localizadas perto de tais entradas: Nganga (mestres iniciados), Mfumu (geralmente líderes políticos), Ngwa-nkazi (tio, a fileira tanto de nós positivos quanto negativos da comunidade), 6 e Mase (pais, poder de proteção). Da mesma maneira, o processo de aprendizado era tipicamente formado por quatro níveis, cada um tomando lugar a partir de um nome específico, correspondente aos estágios no Dikenga (A Roda Cosmogônica), segundo a cor que representa aquele estágio (amarelo, preto, vermelho ou branco).
O tempo no Pensamento Kongo
As “represas do tempo” representam demarcações temporais que variam de minutos a horas e dias, dependendo do contexto.
Assim, quando um Mukongo diz “Nós tivemos funerais no mês passado”, ele está falando de dias, não de horas.
Se ele disser “Eu vou parar na casa de minha avó”, está aparente que ele está falando de horas (falando, rindo, aprendendo, por exemplo) e não de dias ou minutos.
Talvez a pergunta nesse momento seria o que significa viver com o tempo.
Entre os Bakongos, assim como entre o povo Bantu, falar sobre o tempo é falar sobre seus n´kama ou “represas” (nascimentos, guerras, casamentos, funerais, caçadas, colheitas e assim por diante).
É conversar, discutir e relacionar-se com os acontecimentos biologicamente, ideologicamente, politicamente, socialmente, culturalmente, filosoficamente e economicamente.
O tempo é sentido, concebido e entendido apenas através destes n´kama ye dunga bia ntangu (represas e acontecimentos do tempo) que ocorrem no caminho de uma linha de tempo sequencialmente visível apenas em nossas mentes (ntona).
Portanto, trabalhar com as “represas do tempo” e não controlá-las é vida e tempo. Essas represas vão e vêm porque estão nos dingo-dingo cíclicos do tempo.
Onde não há mambu (dúvidas, conflitos, problemas) o tempo não está se movendo: assim como não existe moyo (vida).
Apenas quando os fatos (dunga) acontecem, as “coisas” se movem e o caminho da linha do tempo torna-se refulgente.
Um novo ciclo do tempo vai se movimentar até que outra colisão o interrompa, para realizar um novo começo, para que um novo movimento do tempo se inicie. Isso começa no tempo e testemunha as marcas de suas “represas” e fatos, um processo que também pode diminuir ou aumentar nosso poder de cura.7
Estar no tempo e com o tempo, isso é, respondendo à ocorrência de suas “represas”, é ao mesmo tempo um processo de regeneração de energia e um processo de cura, uma caminhada mental pelo caminho cósmico do Dikenga.
Significa também marcar (tanda) e experimentar as represas do tempo na linha perpétua do tempo, especialmente quando “na vertical” (telama lwimba-nganga) em seus quatro principais pontos de marcação: musoni, kala, tukula e luvemba. Esses são os pontos das grandes colisões, não apenas nos processos de transformação planetária, mas também na vida biológica dos indivíduos, um processo que é necessário para a transformação (nsobolo) acontecer.
Vários estudos na África tentaram rotular o fato de que o mundo africano é inativo, indiferente, isso é, um mundo sem a consciência do tempo.
Entretanto, eu sei que ninguém pode sobreviver na África sem a consciência do tempo. O tempo, como foi mostrado aqui em seus processos de quatro estágios temporais, ordena virtualmente cada aspecto da vida do Kongo. Para pescar e ter sucesso, deve-se conhecer o tempo certo. Para preparar a terra para o plantio e obter uma excelente colheita, é preciso saber quando começar o trabalho. Deve-se saber quando aventurar-se dentro de uma floresta e evitar as picadas de mosquitos e cobras. Tudo seria impossível sem o conhecimento e entendimento do conceito do tempo.
Para o povo Bantu, não existe algo como estar “atrasado” (ao menos que aconteça da pessoa ter sido educada fora da África). Deve-se aprender a ser paciente.
“Mvula kasukina mu matuti, n´kaku” – “se a chuva não alcança o solo (terra)” diz o Kongo, “deve haver alguma barreira”.
Um entendimento dessas REPRESAS (n´kaku) é central para o real entendimento do conceito do tempo e suas funções entre o povo Bantu, porque o tempo por si próprio é inútil, mas suas represas não o são (Ka ntangu kibeni ko kansi n´kama miandi mivwidi lukumu).
“Estar atrasado” é apenas um caminho para responder a outros aspectos do n´kama mia ntangu que não estavam previstos no momento em que um ponto “fixo” na linha convencional do tempo foi decidido.
Pode-se fluir de uma represa do tempo (obrigação fixa) a outra apenas se não há colisão imprevista (fato/dunga) entre as duas, tal como uma criança pendurada em uma ponte, presa pelos pés.
Por outro lado, deve-se lidar primeiramente com essa entre-represa (nkam-bakani) ou colisão.
Viver no tempo é ser capaz lidar ao mesmo tempo com as represas do tempo conhecidas e desconhecidas à medida em que elas acontecem através do dingo-dingo dia ntangu (processos do tempo).
Isso também envolve compreender a inter-relação entre o passado, o presente e o futuro.
É ser capaz de zinga ye zingumuna luzingu lwa ntangu, rolar e desenrolar o pergaminho do tempo, ou seja, entender e interpretar o presente (zona do tempo B) desenrolando e revisando parte do pergaminho que contém a experiência do aprendizado (zona do tempo A) e se posicionar para prever o futuro (o passado do amanhã) enrolando ou revelando as partes escondidas do rolo no qual n´kama miampa mia ntangu (novas represas do tempo) serão impressas pelo ser humano ou pela natureza (zona do tempo C), como mostra a Figura 2.4.
Essa figura incorpora o conceito Bantu do passado, do presente e do futuro do tempo.
O tempo é concebido como um pergaminho enrolado (luzingu) que requer o dobro de ações do indivíduo, que diz “Eu estou no tempo presente” (Mono ngiena mu tandu kiaki), a fim de entender: zinga ye zingu-muna luzingu lwa ntangu (o enrolar e desenrolar o pergaminho do tempo).
Através do zinga ye zingumuna (rolar e desenrolar), o passado vai e volta para nós no tempo presente; através do zingumuna (desenrolar) nós descobrimos o futuro, o passado do amanhã. Nós dizemos que através do zingumuna (Z), o pergaminho do tempo, o futuro vem até nós.
Através do zinga ye zingumuna (Zz), que são processos diários da vida, o homem pode trazer para si mesmo, no tempo presente, o melhor e o pior tanto do passado quanto do futuro.
Em outras palavras, viver (zinga) e estar (kala) no tempo é ser capaz de se mover livremente para frente e pra trás no desenrolar do tempo, ou seja, viver constantemente no passado (segmento A), no presente, o futuro passado (segmento B), enquanto desdobrando o desconhecido escondido (segmento C), o futuro presente.
O tempo é o movimento da energia consciente (ngolo zasikama) dentro da matéria biológica/corpo (ma/nitu) no caminho tanto individual, quanto do ciclo cósmico universal da vida e dos sistemas sociais (dikenga dia zingu/moyo ye fu). Assim, estar no tempo não é apenas ir através dele, mas também experimentar a vida caminhando nas n´kama mia ntangu (represas do tempo). É estar afinado com o fluir da energia viva, compartilhando sua melodia.
N´zungi - Viajante
N´zungi [a] nzila – Um simples viajante no caminho [cósmico]
N´zungi - Viajante
N´zungi [a] nzila – Um simples viajante no caminho [cósmico]
Banganga ban´e - E aqueles iniciados
E-e-e.8 - Eles são o mesmo.
A canção mencionada acima é da escola de iniciação do Lèmba, uma das quatro maiores escolas de ensino superior que existiram no Império Kongo, e é percebida filosoficamente de uma forma bem sofisticada no aforismo Kikongo, Ma´kwenda! Ma´kwiza – “o que está acontecendo (agora) voltará (depois)” – o que flui através de movimentos cíclicos seguirá movendo-se.
Tempo é cíclico, assim como a vida e todas as suas ramificações, que fazem com que as mudanças sejam possíveis através dos processos que deixam marcas nas “represas do tempo”.
Conclusão
O conceito Bantu-Kongo do tempo discutido aqui pode parecer algo completamente novo, não apenas para leitores leigos do pensamento e da filosofia Africana, mas também para aqueles que trabalham nessa área.
O motivo poderia ser, entre outros, para reformular o que a escola norte-americana pontuou devido à falta de entendimento das cosmologias africanas. O tempo, para os Bakongo, pode ser discutido a partir de todos os aspectos da vida porque cada um deles é um agente criador de fatos na linha cronológica do tempo.
As seguintes conclusões podem ser traçadas a respeito do conceito Bantu-Kongo do tempo:
1. O Tempo é “algo” que está em curso cosmológico, e assim sendo, cosmologicamente falando, o tempo é a duração entre a finalização dos processos de formação do primeiro planeta e suas transformações e a finalização dos processos de formação do último planeta e suas transformações em direção aos quatro grande passos do cosmograma Kongo. Um planeta permanecerá “nú”, sem vida, até que esses estágios sejam finalizados.
2. O Tempo é “algo” que está em curso biológico, e assim sendo, biologicamente falando, o tempo é o período vital entre a concepção da primeira gravidez (de Lumbu e Muzita, o primeiro casal na mitologia do Kongo) e a concepção da última gravidez, para que aconteça o cordão biológico da raça humana. Cada espécie vivente tem seu próprio período biológico de vida na trajetória da linha do tempo.
3. O Tempo é “algo” que está em curso social, e assim sendo, socialmente falando, tempo é a duração entre o ponto em que ocorre o primeiro acontecimento social (dunga) no nosso planeta e o ponto em que ocorre o último acontecimento.
4. O Tempo é “algo” que está em curso natural, e assim sendo, naturalmente falando, o tempo é a duração entre o ponto em que a natureza (m´belo, nsemokono) tornou-se plenamente viva e capaz de sustentar a vida biológica e o ponto em que a natureza será incapaz de realizar tal função. Essa será a maior colisão na história do planeta Terra em sua trajetória cronológica. O tempo está dentro de nós e ao nosso redor porque nós, como parte do universo, somos parte do tempo. Nós somos o tempo porque somos “n´kama mia ntangu”, as represas do tempo.
NOTAS
1. Uma boa discussão sobre a linguagem literária do Kongo pode ser encontrada em “Mbelolo ya Mpiku, Introduction à la literature Kikôngo”, Research in African Literatures 3 (1972): 117-61.
2. Para uma discussão mais profunda, veja K. K. B. Fu-Kiau, “Mukuku Matatu: Les Fondements Culturels Kôngo”, manuscrito inédito, p. 400.
3. K. K. B. Fu-Kiau, Africa: The Upside-Down Sailing Ship (New York: Carlton Press, in press), p. 35.
4. Também conhecido como Mahûngu, Malûngu e Mavûngu.
5. O tema é longamente discutido em K. K. B. Fu-Kiau, “Makuku Matatu”, pp. 83-91.
6. O ngwa-nkazi (tio) é o agente tanto das forças positivas quanto negativas da sociedade. Ele tem acesso ao poder e à liderança e pode abençoar as pessoas, por outro lado, ele tem a “energia” para punir, amaldiçoar e causar a morte.
7. Para uma discussão mais profunda, veja K. K. Bunseki Fu-Kiau, Self-Healing Power and Therapy (New York: Vantage Press, 1991), pp. 93-99.
8. Essa canção poética da Escola de Iniciação Lèmba foi composta na linguagem altamente sofisticada dos mestres e não pode ser literalmente traduzida na língua inglesa. A tradução proporcionou transmitir a essência do texto. Para uma discussão mais profunda, veja K. K. Bunseki Fu-Kiau, N´kongo ye Nza Yakun ´zungidila/Le Mukongo et le Monde qui l´Entourait (Kinshasa: ONRD, 1969), pp. 26-30.
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