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Cacuriá, uma brincadeira

Este artigo foi publicado pela "A GAZETA", São Paulo, 14 de outubro de 1975.
Nova dança passa a integrar o folclore maranhense
Uma das mais bonitas manifestações folclóricas acaba de ser catalogada no Departamento de Turismo do Maranhão. Trata-se dequase inédita em São Luís — caixas, bambos de caixas ou baile de caixas, recentemente introduzido no folclore maranhense, tendo como seu criador, Alauriano Campos de Almeida, popular Lauro.
O cacuriá de caixas é uma dança folclórica muito conhecida em algumas regiões do hinterland maranhense, variando de nome, de região para região. No município de Guimarães (de onde veio para São Luís) é cacuriá, em Pinheiro, bambo de caixas, e em Penalva, baile de caixas.
O batuque do cacuriá é muito semelhante ao do Divino Espírito Santo, mas as partes dançantes executam um ritmo muito engraçado, quando é formado de um cordão circular, com todos os pares e as caixeiras, saindo um casal de cada vez para o centro do círculo, e com um abano na mão, começam a dançar separados, chegando a se tocarem apenas com o abano, quando é feito o punga, e retornam ao cordão, dando lugar a outro par. As dançadeiras podem ser de qualquer idade, existe até 75 anos, e enquanto se desenvolve a dança, as caixeiras, em número de seis, cantam toadas ou desafio, de improviso, sendo acompanhadas, em coro, pelos dançantes.

Mistura de ritmo
Alauriano Campos de Almeida explica que a dança do cacuriá é uma mistura de samba, marcha e valsa e "chorado", o que exige muito esforço físico. Por isso é que as partes não passam de trinta minutos.
Lauro é responsável ainda, por quase todos os tipos de manifestações folclóricas de São Luís, como bumba-meu-boi, tambor de crioula, festa do Divino Espírito Santo, escola de samba (o Baralho do Samba) e presépio de palhinhas. Diz ele que fazer folclore no Maranhão é uma questão de se divertir, pois as ajudas oferecidas pelos órgãos públicos não compensam o trabalho dele e de sua esposa, Florinda Conceição Olímpio, responsável pela criação e confecção das fantasias de todos os tipos de manifestações folclóricas levadas a efeito por Lauro.

Vai acabar a festa do Divino
Lauro informou que a festa do Divino (sua tradicional festa) vai ser eliminada, este ano, por falta de condições financeiras para continuar. A magra ajuda que recebe do governo do estado e a prefeitura para as outras manifestações folclóricas, não dá para desviar nada para o Divino.
Assim que aprendeu a tocar caixa, a pequena Teté passou a ser frequentadora assídua de ladainhas e alvoradas. Sua inserção no mundo da cultura popular se deu por volta dos seus 50 anos, quando começou a participar das festividades do Divino Espírito Santo, promovidas pelo folclorista Alauriano Campos de Almeida, o 'seu Lauro', na Vila Ivar Saldanha, em São Luís. Integrou também o tambor de crioula, mas sua grande paixão foi a dança do cacuriá.
Sempre polêmica com seu jeito de dançar – no cacuriá de seu Lauro era a única que rebolava de jeito sensual – destacou-se em tudo o que fez, e em 1980 recebeu um convite do Laboratório de Expressões Artísticas (Laborarte) para ensinar o toque de caixa do Divino para uma peça teatral chamada 'Passos'.
Em 1986, com a ajuda do grupo, criou o Cacuriá de Dona Teté, que hoje é conhecido dentro e fora do país. O grupo fez apresentações em vários estados brasileiros, e em 1994 mostrou a dança em Portugal.
Dona Teté foi casada com Manoel dos Santos, a quem chamava carinhosamente de 'seu Manoel' ou 'Carneiro'. Teve apenas uma filha, que lhe deu cinco netos. Seu Manoel não gostava muito da ideia de sua esposa passar as noites de São João pelos arraiais da cidade dançando ou cantando cacuriá, mas não reclamava e nunca a impediu de fazer o que gostava. Em 1997, Dona Teté perdeu o seu fiel companheiro.
De sua família, a única pessoa que herdou o gosto pelo cacuriá foi seu neto, Beto, que já foi caixeiro da brincadeira e seu grande parceiro em todas as apresentações e diversões do período junino.
Também coreira de tambor de crioula e rezadeira de ladainhas, Dona Teté dizia que sua maior alegria era ensinar as pessoas – crianças, jovens, adultos ou idosos – a dançar, a cantar e a tocar o cacuriá. Diz que, quando morresse, queria ser lembrada como aquela que ensinou ao povo a dança do cacuriá.
Vai ser lembrada por muito mais: por sua voz acridoce, seus toques secos e certeiros no couro da caixa, seu sorriso moleque e seu rebolado sensual – marcas registradas da dama da cultura popular.

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